Edição 71
Só em agosto, US$ 1,2 bilhão foram levantados por startups latino-americanas.
Mais: A briga da OpenAI com o New York Times e a América Latina fica à frente do Canadá em investimentos em startups.
Show do bilhão
Na edição 69 já tínhamos dado uma prévia de que agosto seria animador para os investimentos em startups. À época, em uma semana, foram anunciadas rodadas que somadas chegaram a R$ 750 milhões só no Brasil. Agora, o número final de agosto para a América Latina foi revelado: US$ 1,2 bilhão foram levantados por startups no mês.
Segundo o SlingHub, foram 79 rodadas conquistadas no mês, chegando ao total de US$ 1,2 bi. Ou seja: foi, de longe, o melhor mês do ano para startups da região.
Vale destacar que além de equity (rodadas que cedem, em troca de dinheiro, participação nas startups aos investidores), o resultado foi impulsionado por outros tipos de rodada, como venture debt e security receivable funds – essas representaram juntas 63% do total do mês (US$ 755 milhões).
De volta à bonança
Mesmo com o crescimento de outros tipos de rodada, as de equity também marcaram um salto – fechando em US$ 352 milhões (84% a mais que julho e 15% a mais que agosto do ano passado).
Segundo o fundador e CEO do Sling Hub, João Ventura, “este foi o melhor desempenho em volume de rodadas deste tipo no país desde maio de 2022, quando as startups negociaram US$ 523 milhões em participação acionária”.
Big numbers de volta
A maior rodada de equity do mês foi a da Gympass de US$ 85 milhões, seguida pela Nomad com US$ 62,6 milhões e, para fechar o top 3, a Principia que conquistou US$ 41,7 milhões.
Nos M&As, o Brasil continua liderando, tendo 13 dos 18 deals realizados na América Latina em agosto. O grande destaque foi a compra de 100% da Magnetis pelo BTG.
À frente do Canadá
Desde 2019 foram investidos US$ 36,9 bilhões em startups da América Latina. O volume posiciona a região à frente de países como Canadá, Singapura, Israel e Japão – ficamos em 7º lugar na lista, segundo relatório do Distrito em parceria com o Softbank.
À frente da LatAm ficaram EUA, China, Reino Unido, Índia, Alemanha e França. Pode parecer injusto comparar países com a região, mas, em geral, investidores internacionais enxergam o bloco como um bloco de investimento.
Considerando o número de rodadas (desconsiderando o montante investido), a região ficou ainda melhor posicionada: em 5º lugar, com 5464 rodadas – atrás apenas dos EUA, Reino Unido, China e Índia.
Brasil representando
Segundo o mesmo levantamento, o Brasil é responsável por 62,9% do total de startups da América Latina, seguido por México (11,7%), Argentina (7,1%), Colômbia (6,2%) e Chile (5,1%).
O levantamento reuniu dados dos últimos 10 anos, com o Brasil sempre liderando em número de startups e o México em segundo lugar. Argentina e Colômbia flutuaram mais e revezaram a terceira posição algumas vezes.
A renovação do ecossistema também foi analisada e as notícias são mais desanimadoras nessa frente. O número de novas startups na América Latina passou de 2 mil ao ano – entre 2015 e 2018 –, para 543 em 2022 e apenas 51 contabilizadas em 2023.
Das 22,7 mil startups em operação, o Brasil figura com 13.365 contabilizadas no estudo. Muito à frente do segundo colocado, o México, com 2.487. Com tamanha liderança em número de startups, não surpreende que o Brasil também lidere na representatividade de investimentos na região – 63,9% de todo o capital investido em venture capital na América Latina foi atraído pelo Brasil.
Vale destacar que o percentual cresceu pela primeira vez em 3 anos. Em 2020, o país tinha 65,9% dos investimentos, em 2021 caiu para 59,6% e em 2022 para 58,1%. Ou seja, voltamos a ganhar importância frente aos outros países da região.
PIB vs. VC
Embora o mercado de venture capital tenha tido avanços significativos nos últimos anos, a representatividade dele na economia brasileira ainda é pequena. No Brasil, a participação em relação ao PIB em 2022 ficou em 0,2% – número que alcançou 0,6% em 2021 e 0,3 % em 2020. Em 2021, a representatividade era a mesma: 0,2%.
Isso indica que ainda há muito espaço para os investimentos em startups crescerem no Brasil. Em países como a França, o número atingiu 0,5% em 2022, nos EUA era de 0,7%. Em Israel, o VC representou 1,6% do PIB em 2022, menor que em 2021, quando chegou aos 2%.
Inteligência artificial, conteúdo copiado
Não tem segredo. A inteligência artificial não cria informações do nada – é preciso de uma base de dados extensa para treinar os modelos capazes de associar informações e criar novas narrativas para satisfazer a pergunta de um usuário.
Enquanto a IA era utilizada em aplicações pequenas, focadas em uma base de dados interna de um negócio, para o uso da própria empresa, tudo estava lindo no reino da IA.
Com a inteligência artificial generativa, como o ChatGPT, da OpenAI, e o Bard, do Google, a linha entre roubo de propriedade intelectual e uma simples fonte de conteúdo começa a ficar embaçada.
OpenAI versus The New York Times
Depois de, por semanas, tentar chegar a um acordo com a OpenAI sobre o uso das reportagens do jornal pela inteligência artificial, o The New York Times avisou: o caso de uso indevido da sua propriedade intelectual pelo ChatGPT pode ir parar nos tribunais.
As negociações entre os dois players estavam caminhando para que se chegasse a um acordo de compensação financeira ao The New York Times pelo licenciamento do uso do conteúdo do jornal pela OpenAI no treinamento da plataforma de inteligência artificial generativa ChatGPT.
A negociação, no entanto, caminhou para uma realidade tão acalorada que terminou em ameaça de processo judicial.
Um precedente para caminhos inéditos
Caso haja mesmo um processo judicial entre o Times e a OpenAI, esse pode ser a disputa legal mais relevante sobre proteção de direitos autorais na era da IA generativa.
A preocupação do NYT é que o ChatGPT se torne, de certa forma, um competidor direto do jornal ao criar textos com respostas baseadas nas reportagens originais dos jornalistas do Times.
Essa preocupação é ainda mais real quando se considera o uso dessas tecnologias em buscadores, como o uso do ChatGPT no Bing, da Microsoft – se alguém faz uma busca online e recebe um parágrafo em resposta, criado por uma IA, qual o incentivo de ir até o site que criou o conteúdo fonte?
Tecnologias como o ChatGPT dependem de uma grande quantidade de informações obtidas por toda a internet para juntar dados suficientes para que o chatbot seja capaz de responder às perguntas. Esse tipo de mineração de dados acontece sem qualquer permissão – e ainda não há uma definição da legalidade desse tipo de iniciativa.
Se a OpenAI for declarada culpada em qualquer ação de propriedade intelectual nesse processo, ela pode ser obrigada a destruir todos os elementos infratores do código-fonte da sua inteligência artificial.
A conta pode ser alta
Nos EUA, as leis federais de proteção à propriedade intelectual têm duras penas aos infratores. Podendo chegar a até US$ 150 mil para cada violação cometida intencionalmente.
No caso da OpenAI, com a cópia de milhões de fontes protegidas, o valor final pode ser muito alto. Alto suficiente para destruir a empresa.
As leis de propriedade intelectual são de fato uma insegurança jurídica grande no modelo de negócios das empresas de inteligência artificial generativa, a não ser que elas negociem com os proprietários das obras protegidas para chegar a um acordo antes de haver consequências mais sérias.